A Filosofia em Africa e a Africanidade da Filosofia: Que implicações?


 

INTRODUÇÃO À FILOSOFIA AFRICANA

I.                   Contextualização da Filosofia Africana

A asserção de que a História não teve o seu desenvolvimento no continente africano consiste em uma ideologia construída no período colonial europeu de enorme influência na construção mental dos povos ocidentais.

Por consequência, invisibilizou as contribuições científicas e filosóficas do continente africano para a Humanidade. Com isso, a desconfiança e resistência para a Filosofia Africana é um facto que encontramos no âmbito académico de maneira que a proposição de um estudo sobre tal tema fornece sempre uma dificuldade muito maior em comparação àqueles que tratam de temas habituais.





 

II.                A Filosofia em Africa e a Africanidade da Filosofia: Que implicações?

Como afirma H. Maurier, a filosofia constitui a nossa maneira de viver uma disciplina estreita e rigorosa, com uma técnica própria e uma longa história. A Filosofia deve ser feita de forma racional, crítica, e sistemática.

A Filosofia como a disciplina teórica científica e individualista emergiu sempre em oposição ao mito as religiões tradicionais e as suas perspectivas dogmáticas e conservador. A africanidade o papel da filosofia tem que ser actuado por filósofos africanos que são sujeitos a actividade filosóficas como seus protagonistas. A africanidade consiste na presença dos filósofos no continente africano na sua origem e sua identificação ao continente africano.

Consiste em discutir e partilhar entre os africanos. A africanidade não consiste em falar da África ou tratar de problemas ou assuntos relacionados com africanos, ao contrário consiste na «partilha e na conversa entre os africanos», que são filósofos qualificados e profissionais e que usam a razão de maneira crítica e criadora.

 



III.             Conceito da Filosofia Africana

A semelhança do que se sucedeu com a Filosofia em geral, o conceito de Filosofia Africana não conhece uma única resposta. O primeiro grande aspecto que marca divergência entre os pensadores é o estatuto da Oralidade.

Alguns autores principalmente da corrente etnofilosófica entendem que a Filosofia Africana funda-se na Oralidade. Para eles, a Filosofia Africana define-se como sendo uma colecção, análise e interpretação de ditos populares como provérbios, lendas e mitos.

Para outro grupo de pensadores, chefiados por PaulinHountondji, negam a ideia de que a Filosofia Africana tenha base na Oralidade, mas na Escrita. Para estes, a Filosofia Africana é uma reflexão sobre os problemas do continente africano feito por próprios africanos.




IV.             As correntes da Filosofia Africana

4.1.Etnofilosofia

Chama-se Etnofilosofia, a todo o pensamento etnológico com pretensões filosóficas.

Assim, a Etnofilosifa constitui uma reação ao pensamento de LEVIN BRUL E GOBINEAU, que consideravam a África como sendo uma sociedade Pré-lógica. Face a isto, o primeiro a reagir a este pensamento foi PLACIDE TEMPELS, um missionário belga, autor da obra ´A FILOSOFIA BANTU´.Tempels acredita na logicidade do Homem africano que se processa de forma colectiva ou mesmo comunal.

Segundo ele, o resultado das experiências dos sábios passados africanos foram uma sabedoria popular que se conserva na memória colectiva. O ´Bantu´, perante inquietações não reflecte sobre as possíveis soluções, mas busca a solução no depósito colectivo.

Esta atitude é inconsciente de acordo com Tempels e para que o ´Bantu´ seja consciente, precisa auxílio do Ocidente, equipado de utensílios científicos (Antropologia e Linguística).

·         ALEXIS KAGAME, um evangelista ruandês, fez um estudo comparativo da estrutura gramatical da língua ruandesa e grega a nível de toda a sua região. Em 1956 lança uma obra intitulada a filosofia «Bantu Ruandês do Ser». Kagame, pretendia com o seu estudo, encontrar na língua ruandesa, as 10 categorias aristotélicas do pensamento. E tendo encontrado, concluiu positivamente afirmando que existe sim a FILOSOFIA AFRICANA. Kagame é considerado o pai da filosofia africana por Paulino Hountandji.

Os etnofilósofos são denominados por terem feito estudos sobre as etnias africanas. Estes defendem que toda a filosofia é uma filosofia sem se basear nenhuma cultura.

·         ANYANWU, diz que a missão do filósofo africano é compreender e explicar os princípios sobre os quais se baseia cada uma das culturas africanas.

De entre tantos outros autores da corrente Etnofilosofia, podemos ainda destacar JOHN MBITI,que como os anteriores, acredita que a Filosofia Africana tem uma base na oralidade e que os ditos populares tem algum conteúdo filosófico.

Assim, a Etnofilosofia sofreu duras críticas. Foi acusada de misturar a Filosofia, a Religião e misticismo prestando culto a razão.

Oprimeiro e mais duro dos críticos foi PAULIN HOUNTONDJI, depois de analisar o pensamento de Tempels e Kagame, preferiu chamá-los de ETNOFILOSOFIA e apelidou KAGAME como sendo pai da ETNOFILOSOFIA AFRICANA. Por conseguinte, Hountondji chumba a Etnofilosofia pelo facto de não ser dinâmica, não ser universal e não ser crítico, enquanto por excelência, a Filosofia deve ter estas características.

·         ÉBOUSSI BOULAGA, entende que existe uma crise de identidade do homem Bantu e a Etnofilosofia é uma tentativa de superar esta crise, mas ao mesmo tempo acaba sendo uma má tentativa, porque a Etnofilosofia não é visionária, ela não olha para frente.

·         MARCIEN TOWA, este filósofo, acusa a Etnofilosofia de ser estáctica e de não possuir propostas concretas para o desenvolvimento do homem Bantu. E apela aos africanos a abraçarem a ciência e a técnica para o seu progresso.

·         KKWASSI WEREDU, para este, quanto a questão da existência da Filosofia Africana, qualquer resposta negativa, mostra uma grande e profunda ignorância. Weredu acredita na existência da Filosofia Africana. E por outro lado critica a Tempels e a Kagame por generalizarem os seus pensamentos como se fossem filósofos Bantus e ruandeses, respectivamente.

·         ODERA ORUKA, propõe a Filosofia Cultural, no lugar da Etnofilosofia e discorda de Hountondji quando este afirma que só os africanos é que podem fazer Filosofia Africana.

 

4.2.Filosofia Cultural

Os sábios africanos definiram as bases culturais para uma Filosofia Africana. O seu esforço no dia-à-dia não chegou a ser Filosofia, dado que lhe faltava o enfoque crítico de uma Filosofia propriamente dita e ao mesmo tempo nota-se este tipo de pensamento está acima da Filosofia na medida em que não aponta na razão humana, mas na pessoa.

Esta particularidade dos africanos junto com o impacto trazido pelo racionalismo ocidental, acabou criando uma situação sócio-cultural e existencial muito importante para os africanos de hoje, na medida em que foram alienados da sua identidade cultural e também colectiva.

Nesta senda de ideias, muitos africanos dedicaram o grande mistério da identidade cultural africana e ao mesmo tempo, procurar descrever o significado de ser negro no Mundo. Foi nesta sequência que apareceu a primeira forma de regular contra a alienação cultural sob a forma da NEGRITUDE, uma actividade que procurou centrar as suas energias na busca pela identidade e afirmação do negro.

 



4.3.Filosofia Política Africana

Paralelamente aos pensadores africanos que se ocuparam a construir a identidade africana, encontramos outro grupo constituído por figuras politicas interessadas em criar um futuro sócio-económico e político para África. Alguns desses políticos e escritores são o caso de KwameNkrumah, JuliusNyerere, Keneth Kaunda, AlbertuLuturi, Agostinho Neto e outros. Sengol é uma excepção que além de político, é também poeta e filosofo. Estes políticos africanos contemporâneos reflectiram sobre o futuro dos seus povos e deram expressão as aspirações das suas nações.

KwameNkruman, fundador da O.U.A, no 5º congresso da OUA realizado em Manchester em 1945, lança o livro ´´must unit´´ ao autor do livro e como.

KARLS C. ANYANWU, a filosofia Africana não é uma Argumentação sobre a existência cultural Africana e nem se quer é a descrição da aquela cultura, quer dizer que, não analisa ou descreve as crenças em deus nas divindades, nos antepassados ou as mascaras, as lendas e os provérbios.

A Filosofia Africana é um esforço para compreender ou justificar os princípios gerais que regulam as crenças do indivíduo africano assim como a sua cultura.

A nota importante destes pensadores africanos é que eles se encontravam numa posição privilegiada dado que no meio de um povo, predominantemente analfabeto, eles tinham um horizonte muito mais amplo para a criatividade política, razão pela qual, eram vistos pelos seus povos como mestres, figuras paternas e ao mesmo tempo como sábios filósofos reis de Platão.

O elemento político e económico de maior relevância para os africanos era o SOCIALISMO. Isto porque o Socialismo esta enraizado na sociedade tradicional africana. Existe na tradição africana, uma concepção da riqueza como algo ao serviço da comunidade mais do que em proveito do individuo. Nenhum indivíduo devera explorar o seu próximo sob o argumento de detentor da maior riqueza.

 


4.4.Negritude

O Pan-Africanismo antes de tomar uma forma predominantemente politica, passou também por uma forma cultural.

RENÉ MARAN é considerado o percursor mais directo da Negritude. Escreveu um romance intitulado ´BATUALA´ muito rejeitado pelos franceses, mas que viria a marcar um momento decisivo para toda a geração negra, como sendo o grito de revolta contra a colonização. Neste romance, Maran dizia ´nós não somos senão animais de carga. Animais? Nem isso. Um Cão? Alimentam-no e cuidam bem do seu cavalo. Nós somos menos do que estes animais, somos mais baixos do que os mais baixos. Matam-nos lentamente´.

Além da violência das afirmações, o romance vale e vinga-se pelo conteúdo literário. Assim, René Maran foi o primeiro autor a exprimir a alma negra, com estilo negro em francês, numa linguagem muito clara, colorida e bem sequenciada, e acabou atacando defrente todo o sistema colonial.

A expressão NEGRITUDE foi lançada nos anos 1933 à 1935 por LEOPOLD SÉDAR SENGOL e AIMÉ CÉSAIRE, sem no entanto se saber a quem realmente cabe a paternidade.

AIMÉ CÉSAIRE, SENGOL e DAMAS foram os grandes poetas da Negritude e consideram três fases na sua evolução:

1.      Tomada de consciência;

2.      Reabilitação do Passado e;

3.      Adaptação às formas novas.

Apesar destes autores terem dado um grande ímput para o triunfo da Negritude, o verdadeiro teorizador foi o filósofo existencialista francês JEAN PAUL SARTRE, no seu estudo que chamou ´ORPHÉE NOIRE´, em a introdução à ´ANTHOLOGIE DE LA NOUVELLE E POESIE NÉGRE ET MALGACHE´. Este autor pretendia que a Negritude se desenvolvesse em uma progressão dialéctica. A sua afirmação teórica e prática da supremacia do branco constitui a sua tese.

A posição da Negritude como valor autêntico e ao mesmo tempo da negatividade, que visa preparar a síntese ou mesmo realização do Homem numa sociedade sem raças.

O começo da Negritude data verdadeiramente de 1939 quando Césaire publicou o seu primeiro grande poema ´CAHIER D´UN RETOUR AU PAYS NATAL´. Com Sengol, a Negritude passou da afirmação de uma cultura negra, a um programa político e social.

A teoria da Negritude viria a manifestar os seguintes elementos:

a)      O racismo anti-racista;

b)      O sentido do colectivismo;

c)      O ritmo;

d)      A concepção anti-sexual do Mundo e da vida;

e)      A comunhão com a natureza e;

f)       O culto aos antepassados.

 



4.5.Pan-Africanismo Político

WILLIAM DU BOIS é considerado o pai do Pan-Africanismo Político. Mas as suas raízes veem desde HENRY SILVESTER WILLIAM, natural de Trindade, que foi considerado como sendo o seu grande mentor. Silvester Pretendia que o pai do pan-Africanismo Politico viesse a formular as teorias das reivindicações dos negros numa base ´´Positiva e não violenta´.

Nem o Pan-Africanismo racial, nem o Pan-Africanismo cultural ou Politico, nasceram em Africa. Muito menos se ligam aos africanos, mas a pessoas que embora de descendência africana, estrangeiras em relação a Africa.

O principal motor de todos estes Pan-Africanismos está na estrutura da sociedade americana baseada em dois extratos ou seguimentos:

1.      Pigmentação ou não da pele: pretos e brancos de um lado, os brancos senhores livres de outros, os negros escravos ao longo das gerações e;

2.      De outro lado, os brancos senhores das técnicas e da riqueza; de outro lado os negros ocupados em actividades humildes por conta alheia. Os brancos livres e conscientes da sua superioridade, do outro lado, os negros considerados inferiores.

Note-se que esta atitude da sociedade americana fez com que os negros começassem a ter consciência de origem e lançou-os em luta de violência ou reivindicações sociais na própria América. Foi isto que fez com que o Pan-Africanismo no seu início, tivesse uma base racial, tal foi o caso de MARCUS GARVEY, o afro-americano de Arlen.

Marcus Aurélio Garvey, era muito preto e desenvolveu a filosofia racista e tinha ambições nacionalistas.Em 1911 fundou na Jamaica um novo jornal, onde começou a apresentar os seus planos graciosos para a emancipação do negro em todo o mundo. ´´O seu lema» África para os africanos; Ser negro não é vergonha é mas uma honra… nós temos orgulho e honra amamos a nossa raça, respeitamos e adoramos as nossas mães´´.

Na linha de pensamento de Garvey, também caminhava Booker Washington, com o se discurso ´Back to África Movement.

Em 1890, o jovem estudante Du Bois escandalizado pelas contínuas injustiças raciais em relação aos negros na América do norte lança dura crítica: ´´Sou negro e tenho glória disso, tenho glória do sangue que corre nas minhas veias´´.

A passagem do Pan-Africanismo Cultural ao Pan-Africanismo Politico foi muito fácil e obedeceu a um ciclo natural de evolução.

O Pan-Africanismo Politico evidenciava os seguintes princípios fundamentais de reivindicação:

1.      A necessidade do voto ao Homem moderno;

2.      As crianças negras devem ter o mesmo acesso ao ensino que as crianças brancas;

3.      As sociedades africanas desenvolver a DEMOCRACIA numa base SOCIALISTA.

O Pan-Africanismo Político de William Du Bois era um movimento de intelectuais e, este factor fez com que logo de pressa tivesse uma grande desvantagem em relação aos seus opositores encabeçados por Buca Washington e Marcus Garvey.

Mas apesar disso, o movimento de Du Bois foi muito bem teorizado e também era muito seguro de si mesmo. Como se poderia notar, em temáticas de organização social, o Pan-Africanismo recomendava o Socialismo democrático, além do simples direito à liberdade e a auto-determinação como queria Buca Washingotn e Marcus Garvey.

 

4.6.A Filosofia Profissional ou Académica

O que qualifica como Filosofia Profissional em Africa é realmente o produto acabado de filósofos africanos treinados cuja a definição e concepção de Filosofia Africana como pensava BODUNRIN, seria aquela Filosofia feita pelos filósofos africanos quer na área da logica, como da Metafísica, da Ética, ou Historia da Filosofia. Segundo este pensador, é desejável que os escritos destes filósofos tenham um contexto africano. Mas que não é necessariamente que isso seja assim.

De acordo com esta perspectiva, o que se admite como sendo Filosofia, não outra coisa senão o trabalho bem argumentado e critico como pensa WEREDU, HOUNTONDJI, BODUNRIN e ORUKA.

Apesar de uma aceitação geral do conceito Filosofia Africana, a tentativa de continuar a expressão Filosofia Profissional Africana aos trabalhos produzidos por filósofos africanos treinados, ainda tem de ser defendida, porque os trabalhos de alguns filósofos não africanos e que estão a trabalhar em Africa ou que a dada altura trabalharam em Africa deveriam ser qualificados como sendo de Filosofia Profissional Africana como defendem alguns pensadores.

Assim, a Filosofia Profissional Africana tem as suas limitações segundo sublinha Oruka. A primeira grande limitação prende-se com o facto de a Filosofia Africana estar mais preocupada com as questões relacionadas com o que constitui a Filosofia em geral e a Filosofia Africana em particular, visto que a sua literatura é basicamente meta-filosofia, sem real relação para com a África.

A segunda limitação da Filosofia Profissional Africana é pelo facto dela se resumir a uma crítica Etnofilosófica, o que faz com que careça de história própria e consequentemente de literatura específica.

A única saída para o progresso da Filosofia Profissional africana reside na mudança do paradigma de investigação, o protesto contra a Etnofilosofia e avançar para o estudo de temáticas e conceitos filosóficos específicos.

Como entende Weredu, a questão a questão o que a Filosofia Africana não devia ser considerada como requerendo uma resposta imediata porque devia ser dada por cada um ao concluir os pontos de um ciclo de investigação filosófica.

4.7.SEVERINO ELIAS NGOENHA

Para este filósofo moçambicano dos nossos dias, a razão foi sempre considerada como o que separa o Homem dos outros seres. Factos que os ocidentais negaram a racionalidade africana. Segundo Ngoenha a manifestação de uma Filosofia autenticamente Africana é uma clara demonstração que o africano é um ser de razão e destruímos o argumento principal da ideologia colonial.

Assim, para ele, a Filosofia Africana não é uma visão colectiva do mundo espontâneo e reflectida implícita como afirmam os etnofilósofos. A Filosofia Africana não é um sistema de crenças a qual a ter conscientemente ou inconscientemente todos os africanos em geral ou mais especificamente os negros de uma etnia particular ou da sociedade africana. A Filosofia Africana existe como as outras filosofias sob forma de literatura e com uma universalidade.

Nisto, a Filosofia Africana será portanto uma visão colectiva do mundo, mas existirá uma filosofia na condição de confrontação do pensamento, individual de discussão de debates quer entre os africanos quer com o resto do mundo

 

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